07/04/2010

Iliteracia de (cada vez mais) jornalistas

O assunto não é novo neste blogue - veja-se, p. ex:
http://beijokense.blogspot.com/2009/06/dificil-relacao-de-alguns-jornalistas.html
http://beijokense.blogspot.com/2009/06/qualidade-do-jornalismo-tem-baixado-de.html

No entanto, este post de Miguel Botelho Moniz chamou-me a atenção para uma tremenda barbaridade aritmética. Um problema que não é do jornalismo, é do nosso sistema de ensino. Aquilo que a jornalista Helena Neves Marques escreveu - supostamente a partir de um relatório da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, ou de um press release sobre o dito - revela que o ensino básico deixa sair da "rede" pessoas sem as mais básicas competências aritméticas...

A jornalista, citando "o documento", diz que «registaram-se 2779 óbitos, o que representa 13 por cento dos utentes assistidos e 18 por cento (...) do total de doentes que saíram da rede em 2009.» Ora, é muito difícil entender como se passa de uma taxa de mortalidade de «13 por cento dos utentes assistidos» para o título da notícia, desenvolvido no primeiro parágrafo: «Mais de um terço dos doentes que deram entrada na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) em 2009 morreu no primeiro mês de internamento, revela o relatório anual da rede».
Garanto-lhe, cara Helena Neves Marques, o "relatório anual da rede" não revela nada disso! Revela que "deram entrada" na Rede 17.156 doentes e que, como escreveu, morreram 2.779 (não interessa dar uma taxa para estes números, já que alguns dos mortos tinham entrado na rede em 2008 e, por outro lado, alguns dos que entraram em 2009 vieram/ virão a falecer em 2010). O que importa é que, desses 2.779, como você mesma escreve, «36 por cento [morreram] no primeiro mês». Ou seja, morreram no primeiro mês cerca de 1.000 doentes, o que representa aproximadamente 6% dos admitidos.

A jornalista da LUSA conseguiu transformar 6% em mais de um terço e este efeito multiplicador foi seguido por vários OCS, graças ao "diz que disse" travestido de jornalismo:
- A "Redacção" de A Bola escreveu que «O relatório anual da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados revela que mais de um terço dos doentes acolhidos, em 2009, morreu no primeiro mês de internamento». A mesma formulação, ipsis verbis, é usada pela TSF, DN (do Funchal, citando LUSA), etc.
- O Diário Digital, conforme citado pelo Miguel, afirmou o mesmo, mas na formulação original da jornalista da LUSA: «Mais de um terço dos doentes que deram entrada na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) em 2009 morreu no primeiro mês de internamento».


No entanto, nem todos os jornalistas utilizaram o mesmo efeito multiplicador. Houve vários a dar a notícia correctamente, i.e. «Mais de um terço das mortes registadas na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI), em 2009, ocorreu no primeiro mês de internamento, revela o relatório anual da rede». Esta foi a frase utilizada pelo iol, pela TVI, pelo i e pelo Público. Como este último cita a LUSA, deduz-se que a agência tenha entretanto corrigido o despacho original ou disponibilizado outro mais completo que, propositadamente ou talvez não, já não incluía a "barbaridade" original.

1 comentário:

  1. Anónimo8/4/10 18:00

    Qts jornalistas são precisos pra trocar uma lampada?
    Quatro.
    Um para subir na escada um p copiar do google e dois para criticar.

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