26/10/2009

As minhas escolhas

Estaline: A corte do Czar Vermelho
Alêtheia, 26€

- Como encara os campos de trabalhos forçados, denominados gulags, nos quais morreram milhares de pessoas?
- Não sou capaz de lhe responder porque, em concreto, nunca estudei nem li nada sobre isso.

A pergunta é do CM e a resposta é de uma deputada do PCP que conta no currículo uma licenciatura em Ciência Política e Relações Internacionais. Esta anedota tem servido, entre outras coisas, para atestar a má qualidade de ensino que supostamente se pratica no "quartel" de onde saí há duas décadas... bastante mais preparado para analisar as deficiências do sistema capitalista do que para analisar o que quer que fosse dos regimes comunistas, é um facto. Ainda assim, prefiro acreditar que é mesmo uma anedota, i.e. a ilustre deputada está simplesmente a fugir à pergunta.

No entanto, não vá dar-se o caso de não ter mesmo "abordado isso", como também não abordou nenhuma "questão concreta dos direitos humanos" na China, aqui fica uma sugestão de 668 páginas que enriquecerá o seu conhecimento sobre os "manuais de maus costumes" da URSS.

22/10/2009

Homofonias

Junca de Morais está preocupado porque os petizes de Lisboa não distinguem "nós" de "noz".
Eu posso fornecer-lhe vários documentos que não distinguem Beijós de Beijoz. :p

Diagnóstico das sondagens

Na sequência do «fracasso das sondagens para as eleições europeias», a ERC nomeou três peritos para estudar o desempenho das sondagens eleitorais e propor medidas «que contribuam para o seu conhecimento público e para a sua credibilização». O estudo, que ainda não conheço, entitula-se «Sondagens e inquéritos de opinião. Diagnóstico e sugestões de medidas a adoptar», e foi apresentado ontem na III Conferência da ERC. Uma notícia divulgada no sítio da ERC apresenta, no entanto, algumas das conclusões e sugestões que me suscitam um comentário.
Em primeiro lugar, a constatação de que o CDS-PP foi «subavaliado em todas sondagens e projecções». Na mesma linha, diz-se que o PCP foi «ligeiramente subavaliado em todas as projecções». Não foram apresentadas as razões para esta "subavaliação" sistemática. Já em 30 de Maio, quando vi sondagens com taxas de resposta fantasiosas, eu apresentei aqui hipóteses sobre enviesamento nas bases de sondagem e deficiente tratamento de não-respondentes e de indecisos. Acredito que haja sobrerrepresentação de votantes CDS entre estes três públicos - não seleccionados, não respondentes e falsos indecisos.
Entre as recomendações, a notícia da ERC destaca «que as empresas de sondagens façam sempre perguntas para estimar a abstenção». Concordo, mas... «António Salvador assume: «não sei medir a abstenção».
Mas a declaração que mais me surpreendeu foi de Jorge de Sá, que «aproveitou, ainda, para apelar à possibilidade de se avançar para as amostras aleatórias com base no recenseamento eleitoral». Estará a pensar em chipar os recenseados?
Foto de Ana Figueiras no coffee-break da conferência

20/10/2009

Resultados eleitorais - Carregal do Sal - 2

O trabalho de Lino Dias sobre os resultados eleitorais no concelho do Carregal do Sal, publicado na última edição do Defesa da Beira (e disponível online no Farol da Nossa Terra) suscita-me uma adenda à análise que aqui publiquei no passado dia 13.
Diz Lino Dias: «No tocante à Assembleia Municipal, o demérito do PSD estará na liderança da lista por Artur Jorge Saraiva (...). Sendo o líder da lista do PS à Assembleia Municipal o mesmo de há quatro anos atrás, altura em que José Manuel Canavarro o superou com uma diferença de 1066 votos, Carlos Jorge Gomes (2596 votos) viu a sua ascensão agora mais facilitada com a candidatura de Artur Jorge Saraiva (2403 votos) neste seu regresso ao PSD.»

Caro Lino Dias: como quantificou o efeito negativo da liderança da lista por Artur Jorge Saraiva? Se, repito, se o diferencial de votos no PSD para a Câmara e para a Assembleia pudesse ser atribuído ao cabeça de lista, usando o seu raciocínio na referida notícia, então ele seria responsável pela perda de 74 votos. De 2005 para 2009, o PSD perdeu 661 votos para a Assembleia, mais 74 do que os 587 que perdeu para a Câmara.
Desde que Atílio Nunes é candidato pelo PSD, a lista para a Câmara teve sempre mais votos do que a lista para a Assembleia. Este ano foram 230, mais do que os 156 de há quatro anos, mas ao mesmo nível do que ocorreu em 2001 (238) e abaixo do que se tinha verificado em 1997 (361). Como vê, parece-me uma grande injustiça afirmar que, se a lista tivesse sido encabeçada por outrém «o descalabro não teria acontecido ou, pelo menos, não teria sido tão frustrante».

Do ponto de vista do PSD, a mim parece-me muito mais "frustrante" o resultado nas Assembleias de Freguesia. Se eu quisesse utilizar o mesmo tipo de lógica que usou na sua análise, poderia dizer que Artur Jorge Saraiva "conseguiu" mais 205 votos do que os candidatos às Assembleias de Freguesia! Na análise que publiquei na semana passada, é bem evidente que a grande derrota do PSD é nas Freguesias. Na votação para a Assembleia Municipal, enquanto o PSD "recupera" 205, o CDS perde 172 e o PS perde 159.

Para além de Currelos e Papízios, o PS foi o partido mais votado para a AF nas secções de Vila Meã, Alvarelhos, Travanca e Pardieiros (ver gráfico abaixo). O CDS foi mais votado em Fiais e Parada, secções onde o partido mais votado para a AM foi o PSD. A "recuperação" de votos para a AM, relativamente às AF (eixo vertical), foi, obviamente, mais expressiva nas secções onde a % obtida na AF (eixo horizontal) foi menor (à excepção de Papízios). Mas foi também assinalável em secções com votações mais equilibradas, designadamente Travanca e Pardieiros, e até naquelas onde o PSD ganhou a AF, à excepção de Cabanas-1 (Sobral não conta, porque não houve lista do CDS para a AF).


Adenda 21-10-2009 10:30: Para clarificar o que escrevi no 2.º parágrafo, acrescento este gráfico com a votação nos três órgãos autárquicos nas cinco eleições em que Atílio Nunes encabeçou a lista do PSD. Visualizando a evolução negativa da votação nas duas últimas eleições, não me parece que tenha fundamento a ideia de que o decréscimo foi particularmente acentuado na votação para a Assembleia Municipal.

19/10/2009

Pouca linha, pouca linha

Diz-se hoje no Público: «A Refer tem vindo a encerrar linhas para efectuar obras, contrariando uma prática centenária em que os trabalhos se realizavam sem interrupção do tráfego ferroviário.
As linhas do Tâmega, do Corgo e do Tua, e os troços Guarda-Covilhã e Figueira da Foz-Pampilhosa, estão fechados e não se sabe ao certo quando reabrirão. Isto porque, em alguns casos, nem sequer há projecto para avançar com as obras.»
A mesma notícia baseia-se numa fonte (da REFER? da CP? da Secretaria de Estado dos Transportes?) para dizer que «Para o Corgo e Tâmega há uma vaga referência ao "início de 2011" para a sua reabertura, mas entre Figueira da Foz, Cantanhede e Pampilhosa não se sabe quando ali voltará o comboio a apitar.»
Em Março e Abril deste ano, postei aqui várias "previsões" sobre a reabertura destas linhas. O Governador Civil de Vila Real começou por dizer que as obras estariam concluídas ainda durante o ano de 2009. Na semana seguinte, a Secretária de Estado dos Transportes adiou a previsão para Setembro de 2010. No entanto, como refere Carlos Cipriano, «para as populações locais subsistem dúvidas sobre se alguma vez o comboio voltará, apesar das promessas em contrário da secretária de Estado dos Transportes, Ana Paula Vitorino, reforçadas durante as eleições num périplo pelo Norte».
É que o povo já não vai em promessas...

16/10/2009

Mudam-se os tempos, mudam-se os peritos

No post anterior sugeri um top 20 de bens, todos eles muito mais adequados à sujeição a IEC do que o café. Para quem não sabe, um grupo de peritos em fiscalidade contratados pelo Governo, sob uma evidente influência de substâncias que actualmente são sujeitas a IEC, produziu um relatório onde aconselha a criação de um imposto especial sobre o consumo de café. A surpresa de tal sugestão distrai a nossa atenção de outras doutas propostas com as quais o Governo não se quer comprometer. Ainda assim, eu não resisto a perguntar:
- Onde estavam estes peritos quando o Governo considerava o café um produto de primeira necessidade com preço fixado em Diário da República?

14/10/2009

Fiscalistas & fiscais dos costumes

«O grupo de peritos a quem o Governo encomendou um estudo sobre a política fiscal de lançar impostos especiais sobre o consumo (IEC) propõe o aumento do preço do café, refrigerantes, latas, embalagens e sacos de plástico, noticia o Jornal de Negócios.Os peritos defendem que este aumento pode ser um estímulo de hábitos de consumo ambientalmente mais sustentáveis e a necessidade de compensar a perda de receita fiscal.» (i)

Na senda da moralização do comportamento por via fiscal, proponho um top 20 de bens sobre os quais deve incidir o IEC:
  1. Queijo da Serra
  2. Tripas à moda do Porto
  3. Gamelas
  4. Viagens de Elisa Ferreira com destino ao Porto
  5. Super Bock
  6. Queima das Fitas
  7. Semanas Académicas em geral
  8. Espectáculos de Quim Barreiros (com dupla tributação se concidir com 7. e/ou 6.)
  9. Discos de Quim Barreiros
  10. Karaoke de Quim Barreiros
  11. Karaoke em geral
  12. Revistas sobre TV
  13. Receptores de TV
  14. Romances de Júlio Magalhães, Rodrigues dos Santos ou Sousa Tavares
  15. Qualquer publicação dirigida por João Marcelino
  16. Todos os suportes impressos ou electrónicos que veiculem ideias de Al Gore
  17. Todos os suportes impressos ou electrónicos que veiculem imagens de Rui Santos
  18. Gel para cabelo
  19. Gravatas amarelas
  20. Carros amarelos

13/10/2009

Resultados eleitorais - Carregal do Sal


O gráfico acima apresenta o número de votos na eleição dos três órgãos autárquicos e na eleição para a Assembleia da República (AR), no concelho de Carregal do Sal.
Os resultados mostram que muitos eleitores distinguem as votações para os diferentes órgãos, mesmo quando elas se realizam em simultâneo.
No que respeita aos órgãos autárquicos, o PS e o CDS atingiram as votações máximas nas assembleias de freguesia (AF) e as mínimas na Câmara Municipal (CM). Com o PSD, aconteceu precisamente o inverso.

O PSD conseguiu mais 231 votos na CM, relativamente ao resultado da votação para a Assembleia Municipal (AM). A maior parte desses votos (127) "chegou" do CDS - um em cada cinco eleitores que votou CDS para a AM terá votado PSD para a CM. Esta transferência CDS --> PSD foi mais significativa nas secções de voto de Parada, Fiais, Alvarelhos e Travanca.
Em números relativos, a mais significativa transferência registou-se nos votos brancos - houve 175 votos brancos para a AM e apenas 116 para a CM, o que equivale a uma "perda" de 1/3 dos votos brancos, presumivelmente transferidos para a lista do PSD.
A CDU (não representada no gráfico) obteve menos 29 votos para a CM do que para a AM, correspondendo a uma "perda" de 1 em cada 4.
Finalmente, a "contribuição" dos votantes PS na AM para a vitória do PSD na CM é de apenas 24 votos, o que corresponde a 1%.

06/10/2009

O Político e o Cientista

Na histeria global em torno do alarmismo das alterações climáticas causadas pela acção humana, há cientistas que, por desejo de protagonismo ou para defender ideologias ou interesses económicos, ultrapassam as fronteiras do método científico. Há políticos que, bem secundados por profissionais da comunicação, estabelecem como inabalável crença o que ainda é uma dúvida científica. E, pasme-se! cientistas que assumidamente apresentam conclusões não fundamentadas, para motivar ou agradar aos políticos.
Um extracto de uma entrevista de Delgado Domingos esclarece este fenómeno:

«O último dos relatórios do IPCC é de Novembro de 2007. O relatório fundamental, o do grupo I, tem 996 páginas. Como é muito técnico e complexo tem um resumo designado por sumário para decisores políticos. O sumário foi aprovado linha a linha pelos representantes dos governos e das organizações participantes em Fevereiro de 2007.
O facto extraordinário é que o sumário foi aprovado ainda antes de existir o relatório que era suposto resumir. Sucede mesmo que o relatório científico contradiz conclusões do sumário antecipado, nomeadamente quando este converte em certezas o que no relatório está rodeado de incertezas, hipóteses e precauções.
(...) Porque é que a um sumário, que é politico, se chama científico? Penso que tal se deve ao facto de os políticos quererem beneficiar da credibilidade que ainda existe na comunidade científica. Por outro lado, a comunidade científica permite-o porque o financiamento dos seus trabalhos depende dos políticos...»

Fonte: Mitos Climáticos

05/10/2009

Bora lá empastelá-los?

Francisco José Viegas: «O legado dos ‘pais da República’, de Teófilo Braga a Afonso Costa, passando por Bernardino Machado e António José de Almeida, deve hoje ser reanalisado e subtraído ao discurso do heroísmo patético do breve regime de 1910. Hoje, ouvir-se-ão discursos sublinhando a herança da República e os valores da República. Uma patetice e uma mentira convenientes.»

António de Almeida: «Observando com atenção o golpe de 1910, percebendo quem foram os seus autores, chego à conclusão que entre eles estavam alguns canalhas da pior espécie que este país já viu nascer. »

02/10/2009

Grandes investimentos - II

Mais uma prova de que é preciso ter muito cuidado na análise dos grandes investimentos:

A gamela de Elisa Ferreira foi um investimento de 395 mil euros e só tem um período de vida útil de três meses?

Margens de Erro - versão Marktest

A Marktest.com é um concorrente de peso ao blogue Margens de Erro, apresentando dossiês de clipping sobre as sondagens publicadas (legislativas; autárquicas) e uma boa análise da comparação entre sondagens e resultados eleitorais. Além do mais, a ficha técnica publicada no site tem uma informação bastante esclarecedora.

Dito isto, era escusado que Bárbara Gomes tivesse borrado a pintura: «No caso da última sondagem da Marktest divulgada nessa semana, podemos verificar que os resultados eleitorais alcançados, todos eles sem excepção, estavam compreendidos dentro das margens de erro apresentadas». Em primeiro lugar, as margens de erro estão mal calculadas, apresentando valores iguais para todos os partidos, o que é, obviamente, uma impossibilidade. Em segundo lugar, apresentando intervalos com uma largura de sete pontos percentuais, mal feito fora que os resultados não ficassem lá dentro! :)

Já que, partindo da sondagem, a Marktest produziu uma projecção de resultados, é correcto fazer uma "análise de desvios" e compreender por que o desvio é maior na projecção do que nos resultados brutos da sondagem.

01/10/2009

27 de Setembro Sempre! Neoliberalismo Nunca Mais!

Caros André Freire e Rui Tavares: o PS é de esquerda ou não é de esquerda?
Se é, então o apelo à estabilidade governativa é inútil. Um partido de esquerda esteve os últimos quatro anos e meio no Governo, com todas as condições para não ter conformado as suas políticas à «hegemonia neo-liberal». Maior estabilidade governativa seria difícil.
Se não é, então o apelo à estabilidade governativa "à esquerda" é fantasioso. E os argumentos numéricos sobre a «vontade eleitoral» do «povo português» são fraquíssimos.

Na verdade, a direita (PSD+CDS) terá nesta legislatura mais 16 ou 17 deputados do que na anterior. A única maneira de dizer que o eleitorado "virou à esquerda" é excluindo o PS da esquerda. Note-se que o PS perdeu meio milhão de votos. BE+CDU ganharam 200 mil. Onde foram parar os outros 300 mil?

As dificuldades em compreender a «vontade eleitoral» são bem evidentes neste post de um aventor. Primeiro, soma PS+BE+CDU, o que dá «Uma esmagadora maioria». Depois reconhece que o PS não é todo de esquerda, o próprio Sócrates não dá muito jeito para uma coligação à esquerda... mas isso não impede João Paulo de concluir «sei é que Portugal votou para ter um governo de esquerda».

Eu dou bastante importância aos números e só acredito quando alguém apresentar uma estimativa credível de quantos dos dois milhões de votos no PS traduzem uma «vontade eleitoral» contra os «preconceitos ideológicos do Sr. Van Zeller». Eu já contabilizei um voto no PS a favor de Van Zeller! :)

Acho louvável o apelo para que «as esquerdas se encontrem e sejam capazes de explicitar o contributo que cada um destes partidos está disposto a dar para se encontrar uma solução estável de governo». Se a Constituição é para manter, então é o Parlamento que deve ser a fonte de legitimidade do Governo e seria muito bom que os partidos se habituassem a negociações e compromissos no Parlamento em favor da estabilidade governativa. No caso concreto, seria até bastante interessante dar aos deputados eleitos pelo PS a responsabilidade de se pronunciarem sobre a melhor solução de governo. Nunca esquecendo que, de acordo com a mesma Constituição, cabe ao PR um papel que não caberia a um Rei!!! Repito, acho o apelo louvável. Mas não posso compreender que o queiram fundamentar numa aritmética que soma os votos no Partido de Sócrates para a esquerda, mas subtrai as políticas do Governo de Sócrates para a direita.