16/06/2009

A inovação nos números

O problema de Gary Langer com os dados tóxicos, que eu associei ao "efeito Diana Mantra" no post anterior, é quase omnipresente nos relatórios de divulgação de inquéritos. Aqui fica um exemplo:

O site Criar2009 divulga hoje uma notícia a partir de «um relatório do Eurostat publicado em Maio com os dados da Community Innovation Survey 2006». Sobre o primeiro parágrafo da notícia, não há nada que contestar, a não ser que não se devia usar a designação UE27, uma vez que os rankings não foram calculados a partir de todos os países da UE27. O problema está no segundo parágrafo e resulta do tal equívoco muito frequente na divulgação de estatísticas. Antes de citá-lo e contestá-lo, um exemplo fictício ajudará à compreensão do fenómeno.

Vamos imaginar que os países A e B têm 100 empresas cada. No país A, 80 são "inovadoras" enquanto no país B apenas 40 o são. Das inovadoras, 40 do país A e 30 do B apresentam inovação de marketing. Qual a "taxa de inovação" de marketing? 40% no país A e 30% no B. Ou seja, no sector do marketing, o país A é mais inovador do que o B. No entanto, se eu calcular qual a % de empresas inovadoras que têm inovação de marketing, o resultado é 50% em A e 75% em B. Erradamente, estaria a dizer que, no sector do marketing, o país B é mais inovador do que o A.

Foi isto que foi feito no relatório e é transposto para a citada notícia: «Ainda de acordo com o mesmo relatório, Portugal ocupa a 8ª posição em percentagem de volume de vendas destinada a produtos novos ou melhorados. Por outro lado, Portugal é o 4º país da UE27 em inovação de marketing e organizacional
Em primeiro lugar, se os cálculos fossem os correctos, não seria de todo lícito dizer «o 4º país da UE27», já que: i) só estão disponíveis dados para 21 dos 27; ii) destes 21, em dois deles foi apenas considerada inovação organizacional, a inovação de marketing não "contou"; iii) só foram consideradas empresas com mais de 10 trabalhadores.
Mas o que realmente interessa para o meu post, é que os dados não sustentam a afirmação, por causa de se ter excluído as empresas sem inovação. Portugal ocupa o 4º lugar na taxa "errada", i.e. na divisão das empresas com inovação de marketing ou organizacional (7226) sobre o total de empresas inovadoras (8774), o que dá 82%, mas este é um índice sem valor substantivo. O que interessaria seria a divisão pelo total de empresas (21254), o que resultaria numa taxa de 34%. A afirmação correcta seria: "Portugal é o 8.º país, num total de 19, em inovação de marketing e organizacional".

1 comentário:

  1. beijokense, você arranja cada uma!
    lá fui ler o relatório e não encontrei nada que diga que Portugal é o 4º país da UE27 em porra nenhuma.
    o autor da notícia teve um sonho.

    ResponderEliminar