(i) está em vigor na maioria dos países europeus e, (ii) particularmente, naqueles cuja população activa é mais qualificada.
A primeira afirmação é evidentemente falsa. A segunda também não é verdadeira, pelo menos a julgar pelo indicador que o próprio Ministério da Educação apresenta para a justificar - a taxa de saída precoce do sistema de ensino, i.e. a percentagem de jovens entre os 18 e os 24 que não completaram o secundário e não estão no sistema.
O ME produziu um "Documento de trabalho para a Audição de Peritos" (audição de peritos depois de tomada a decisão!) - disponível em PDF aqui - onde apresenta uma tabela com a escolaridade obrigatória (em anos de escolaridade e em idades limite) e as taxas de saída precoce. Eis a transcrição do documento no que respeita à leitura da tabela:
«A relação entre os anos de escolaridade obrigatória e o abandono escolar precoce não é linear. Assim, numa abordagem cruzada da duração da escolaridade obrigatória e das taxas de abandono escolar precoce, é possível dizer que não havendo uma correlação visível entre a duração da escolaridade obrigatória e os resultados escolares medidos pelo abandono escolar precoce, os países com elevadas taxas de abandono são – exceptuando Malta – países com escolaridade obrigatória de duração relativamente curta. Estes resultados não desaconselham, antes pelo contrário, a introdução da escolaridade obrigatória até aos 18 anos ou até à conclusão do secundário em Portugal. Porém, experiência de outros países mostra que não basta essa obrigatoriedade para obter os resultados esperados. De facto, são vários os factores que interferem negativamente no abandono escolar precoce e, se nenhum deles resulta da duração mais prolongada da escolaridade obrigatória, muitos podem condicionar os respectivos efeitos.»
Os acérrimos defensores do alargamento aos 18 anos não costumam citar esta leitura, nomeadamente que "são vários os factores que interferem negativamente" na suposta relação negativa entre obrigatoriedade e saída precoce, para a qual o documento afirma não haver "correlação visível".
Voltando ao documento, registo que, não vendo a tal correlação, os autores permitem-se concluir que «os países com elevadas taxas de abandono são – exceptuando Malta – países com escolaridade obrigatória de duração relativamente curta.» Noto o relativamente e a excepção maltesa :) e acrescento que essa conclusão não é indubitavelmente fundada nos dados apresentados. Para mais fácil leitura, apresento os dados publicados no documento no gráfico abaixo, ordenado pela taxa de saída, representando a vermelho os países com 12 ou 13 anos de escolaridade obrigatória, a azul os que têm 10 ou 11 anos de escolaridade obrigatória e a preto aqueles onde a escolaridade obrigatória não ultrapassa os nove anos.
Se nos concentrarmos não nos países com maior taxa de saída, mas, pelo contrário, nos que têm maior taxa de conclusão do secundário, poderemos reescrever a conclusão do documento, desta forma: os países com as mais baixas taxas de abandono são – exceptuando a Polónia – países com escolaridade obrigatória de duração relativamente curta. Isso é bem visível na parte inferior do gráfico, no primeiro quartil (saída < 10%).
Qual das conclusões é mais "manipuladora" - a minha ou a dos autores do documento para audição de peritos?
Os Gráficos e as estatísticas foram inventados para se ler neles o que queremos ver realçado.
ResponderEliminarQuando queremos, os gráficos e as estatísticas de modo geral corroboram com os interpretes, servido-lhes de bengala para se apoiarem enquanto alegremente nos atiram areia para os olhos ou noutros casos para servirem para tapar o sol com a peneira.